A fogueira das redes e as novas bruxas; o caso dos envenenamentos em Parnaíba
Esse caso não é isolado na sociedade, tanto no possível erro como no justiçamento social através das redes, basta uma simples leitura nos comentários das matérias policiais
Por Hartonio Bandeira
ADV. OAB-PI 6.489
Em agosto de 2024 uma mulher, com mais de 50 anos, teve seu nome divulgado, em rede nacional, em matérias que afirmavam que ela teria envenenado duas crianças, 7 e 8 anos, através da doação de cajus manipulados com veneno.
Ela foi presa em flagrante, logo após o crime, enfrentou a audiência de custódia e teve a prisão preventiva (sem data específica para sua soltura) decretada, após, foi conduzida até a penitenciária mista da cidade de Parnaíba, Piauí.
Segundo “informes” a vizinha, Lucélia, era a principal suspeita, pois, ja teria envenenado animais e teria “desavenças” com a vizinhança.
A polícia investigativa constatou que as vítimas foram envenenadas, Lucélia, negou a autoria do crime. Os cajus, não foram periciados.
A lei prevê, em casos dessa natureza e que o investigado está preso, que a investigação seja concluída em até 30 dias, podendo ser porrrogado, de forma justificada e por tempo RAZOÁVEL.
Lucélia está presa há mais de 100 dias, sem resultado de qualquer perícia nos cajus que ela teria doado, e que teria sido o meio para o envenenamento.
O fato, da forma narrada, configura homicídio qualificado, classificado como crime hediondo, com pena que poderá ultrapassar os 30 anos de prisão.
Populares e vizinhos, de forma sumária, incendiaram a casa de Lucélia e pediam sua morte.
Nas redes sociais, o justiçamento realizado por muitos, também pedia a morte de Lucélia.
Ocorre, que no primeiro dia do ano em curso, 09 pessoas, familiares das duas crianças, foram envenenadas, a mãe e outros dois filhos dela, faleceram.
E agora, teria sido a vizinha?
Além de estar presa, o veneno, dessa vez, não estaria em cajus.
Inicialmente, segundo informes na internet, a causa poderia ter sido pela ingestão de peixes, que haviam sido doados, porém, os doadores seriam pessoas idôneas (Lucélia era “encrenqueira”), o que impediu uma prisão em flagrante.
Segundo as autoridades, todos os nove membros da família teriam ingerido um arroz contaminado que foi preparado na casa da própria família, e este, foi cuidadosamente induzido para o consumo.As autoridades, dessa vez, falam em CRIME DE ÓDIO, como motivação, do pater familiar contra todos os entes daquele núcleo.
O homem foi preso e apontado como autor dessa tragedia.
Ele nega!
Na data de hoje, em divulgações tímidas, há a notícia que o promotor que atua no caso, opinou pela soltura de Lucélia, nao descarta que ela matou as crianças, mas, entende, que ela deve ser posta em liberdade.
Lucélia, culpada ou inocente, já queimou na fogueira das redes, por mais que seja inocentada, ficará nos grupos de WhatsApp, nas redes, que não podem ser apagadas, rasgadas ou queimadas, seu nome permanecerá como assassina para muitos que não tiverem acesso ao desfecho final.
Mesmo não havendo registro formal, alguns bradam que houve confissões, nos momentos das prisões. Lembremo-nos, que, na santa inquisição, pessoas com o laço do enforcamento no pescoço, tinham a chance de confessar e “serem salvas”.
No desespero, muitas confessavam e esperavam que o laço fosse tirado, no entanto, como único consolo, ouviam que a confissão livraria a alma do inferno, não do enforcamento.
Esse caso não é isolado na sociedade, tanto no possível erro como no justiçamento social através das redes, basta uma simples leitura nos comentários das matérias policiais, em grafias, muitas vezes mal redigidas, pede-se pena de morte e entoa-se a máxima “BANDIDO BOM É BANDIDO MORTO”.
Diferentemente da idade média, em que o corpo era queimado de uma única vez, e, apesar de doloroso, tirava-se a vida naquele ato, nos dias atuais, as redes queiman aos poucos, diariamente, com as chamas acessas e com a velocidade de um click, deixando a pessoa viva mas matando-a lentamente até o desencarne.
ubi non est justitia, ibi non potest esse jus
Comentários
Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião desta página, se achar algo que viole os termos de uso, denuncie.